11 de junho | 2017

Um retrato (em branco e preto) na parede

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Ivo de Souza

“Minha dor é perceber que, apesar de termos feito tudo que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”.

A foto da revista traz (“Fomos tão Jovens”) Eduardo Suplicy, Lula e Fernando Henrique Cardoso. Eduardo e Lula com 30 anos ou pouco mais (“na casa dos 30 anos”) e FH com pouco mais de 40 anos ou (“na casa dos 40”). Luiz Inácio Lula da Silva, no centro da foto, sério (já bigodudo e barbudo); Suplicy, à esquerda, e Fernando Henrique, à direita, ambos com largos sorrisos, os dois eram considerados, além de políticos promissores, os galãs da política da época (FH, a um tempo, chegou a ser chamado de príncipe pela mídia, vejam só!). “Velhos tempos, velhos dias…”

A foto da década de 1970 foi feita numa época difícil para o Brasil: a política era controlada pela ditadura militar “…que prendia, torturava”, matava e calava a boca da imprensa: os meios de comunicação eram dominados e censurados pela força das armas dos militares, assim como a vida de quem ousasse discordar de um regime de exceção, autoritário e violento.

Àquela época, já militavam na política brasileira, homens mais experientes (em número bem maior que os três jovens da foto). Entre eles, o sr. Ulysses Guimarães, que, numa sacada de mestre, constatou que os políticos estavam envelhecendo e que era preciso abrir as portas aos jovens com ideias novas e com ideologia a guiar seus rumos dentro do intrin­cado e complexo mundo da política, hoje, um submundo do colarinho branco, antro de corruptos (salvo algumas poucas exceções), desonestos e espertalhões, donos de um poder podre, velho e em via de extinção, (graças aos céus), donos do destino do país.

Conta João Gabriel de Lima, diretor de redação da revista Época, que a raposa velha (bom sentido), o astuto e experiente dr. Ulysses foi quem teve a ideia de agrupar políticos jovens em torno de FH, candidato ao Senado.

Além de Lula e Suplicy, José Serra também se juntou ao grupo. Serra era tido, na época, como esquerdista radical, esquerdista de primeira hora.

Desse caldeirão político, emergiram o PSDB e o PT, hoje enfraquecidos, divididos, alquebrados, com seus caciques citados e inqueridos na Operação Lava Jato. Alguns continuam presos.

Uma constatação é evidente: a foto e seus personagens envelheceram. E a política brasileira estagnou-se. Tornou-se velha também. Obsoleta, cheia de vícios.

Praticamente, são os mesmos políticos que aí estão há décadas. Não houve renovação.

Os velhos políticos, por meio da velha política, tentam se perpetuar no poder, querem manter seus privilégios, as mordomias que, indevidamente lhes são oferecidas. E o novo nunca vem: os jovens são  barra­dos pelos donos do poder em suas intenções de mudar o que se estabeleceu, no país, como política, ou melhor, como politicalha, politicagem.

A grande novidade (?), pasmem, senhoras e senhores, na cena política brasileira, é o sr. João Doria (que já não é mais nenhum jovem, está prestes a completar sessenta anos). E cuja forma de governar é velha, ultrapassada, com atitudes sensacionalistas e com ares poli­cialescas (nada contra o sr. Doria, tudo contra sua forma atrasada de governar (“mandar”).

E a política (isso explica a fuga dos mais jovens) tornou-se, infelizmente, sinônimo de safadeza, malandragem, coisa de ladrões. E o sistema continua arcaico. Não se renova – na verdade, a política, na melhor significação da palavra, é sinônimo de cidadania, tem um sentido nobre, hoje, desprezado pelos políticos em geral.

Gabriel de Lima fala de debates em torno de ideias velhas (“século passado”) e que os jovens poderiam vir, com ideias novas, arejar esses debates quase moribundos.

Há uma geração de jovens que, ainda, muito nebulosamente, começa a ver a política com olhos, ideias e expectativas rejuvenecidos. E que veem a velha política e os velhos políticos como algo a ser deixado no passado, pois não atendem mais aos anseios do povo brasileiro, povo que não se sente representados por essa velha, obtusa forma de governar. Precisam abrir canais de comunicação com os partidos e seus velhos e decadentes caciques, pois querem fazer política alicerçada em ideias novas de que a sociedade brasileira tanto precisa, principalmente num momento em que partidos e políticos desmoronam como castelos construídos na areia: velhos, ultrapassados, carcomidos pela corrupção e pelo desejo de se perpetuarem, repito, a qualquer custo no poder. Que venham os jovens para renovar e recolocar a Política no patamar em que ela sempre mereceu estar, desde os tempos da democracia grega, que pregava um governo para o povo, quando os debates políticos eram feitos nas praças, onde todos podiam falar, expressar suas ideias, seus sentimentos e desejos em relação à vida em sociedade, onde a cidadania era exercida em plenitude, não apenas como hoje é: uma palavra que virou modismo e, por isso mesmo, esvaziou-se de seu sentido pleno, pois não chega à realidade da maioria do povo brasileiro.

 

Ivo de Souza é professor universitário, poeta, colu­nista, pintor e membro da Real Academia de Letras de Porto Alegre.

 

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