29 de agosto | 2021

BOs sobre sacrifício de animais geram discussão acirrada sobre religiões afras

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Assista a entrevista a partir de 37 minutos do vídeo do programa Cidade em Destaque da Rádio Cidade.

 

Líder de templo acusado por ONG confirma e explica o porquê do sacrifício de Bodes e galinhas. Babalorixá ficou chateado e afirmou que existe preconceito com as religiões diferentes do cristianismo.


O registro de dois Boletins de Ocorrências, um pela Polícia Militar e outro na Polícia Civil, no sábado, dia 21, após sua divulgação pelas emissoras de rádio da cidade, acabaram gerando intensa discussão nas redes sociais e gerando polêmica sobre o sacrifício de animais por religiões de origem africana que perdurou por vários dias.

As discussões acaloradas, inclusive nas rádios, se deram tanto por ter sido mencionado em um dos BOs que seria um ritual de magia negra o que estaria sendo praticado com o sacrifício de animais na Casa de Candomblé e Aldeia do Caboclo Flecheiro no Jardim Blanco. A outra foi sobre as diferenças entre o Candomblé e a Umbanda.

No entanto, as dúvidas acabaram sendo sanadas pelo próprio acusado de sacrifício de animais que além de assumir que em seu templo são sacrificados bodes e galinhas, acabou dando uma aula sobre as religiões africanas em entrevistas as emissoras de rádio da cidade.

HIAGO FOI ENTREVISTADO PELA RÁDIO CIDADE

Para a Rádio Cidade, no programa “Cidade em Destaque”, da Casa de Candomblé e Aldeia do Caboclo Flecheiro, o Babalorixá, zelador e sacerdote do templo, Hiago Pires Pimenta, contou que o Templo de Umbanda Caboclo Flecheiro foi fundado por sua avó e que atualmente é uma casa de Candomblé.

O babalorixá explicou que o Candomblé veio com os escravos e eles adaptaram a crença que tinham na África com os santos católicos, assim surgiu o Candomblé.

Já a Umbanda teria cerca de 115 anos, numa fusão de várias crenças, onde, com a introdução do Kardecismo, começaram a se deparar com a presença de espíritos nativos brasileiros em suas mesas de culto e para o branco o espírito do índio e do negro eram inferiores, então não eram bem vindos para aquela crença. Daí que começou a surgir uma nova crença que é a Umbanda como junção de várias crenças, dos negros, dos índios, e dos brancos (Cristianismo e o próprio Kardecismo).

SACRIFÍCIO DE ANIMAIS
NÃO ACONTECE SÓ NO CANDOMBLÉ

Sobre o sacrifício dos animais que causou polêmica comentou que este fato não acontece de hoje e somente no candomblé. A igreja Católica, por exemplo, não faz mais isso, mas na mesa, para comemorar o Natal, há uma perú, ou outras carnes para celebrar o nascimento de Cristo.

“Para o Candomblé, tudo o que é natureza é Axé. Somos parte da natureza”, afirma. “A urbanização nos afastou da natureza, mas viemos da terra e para a terra voltaremos. O Candomblé tem sua base numa cultura primitiva em que o homem se conhece pela natureza, e considera natural o homem numa cadeia alimentar se nutrir de algum animal”, destacou.

NO CANDOMBLÉ CADA ANIMAL
TEM SUA REPRESENTATIVIDADE

Hiago continua: “No Candomblé cada animal tem a sua representatividade. Então um vai ser abatido por questões de doença, outro por causa de caminhos travados por conta de trabalho. O Candomblé é um leque muito vasto de rituais para o bem da humanidade desde que a humanidade entenda o seu dogma e o porquê daquilo que está sendo feito”.

Quanto ao caso polêmico, atribui a culpa aos vizinhos que fazem as denúncias de forma anônima, sem tentar ao menos conversar sobre o assunto. “Tudo o que fazemos é amparado em lei. Até um boi pode ser sacrificado em nossos rituais, pois a lei permite”, destacou.

“A preocupação do representante da ONG era saber se havia animais domésticos sofrendo maus tratos. Disse que havia animais para serem abatidos no sábado, religiosamente. Autorizei a entrada dos policiais com o representante da ONG, encontraram os animais que seriam sacrificados e que a lei permite, não encontrando animais domésticos. Ai o representante da ONG partiu para uma outra situação de crença pessoal dele”, afirmou.

99% DA POPULAÇÃO COME CARNE

Hiago conta que disse que não podia ser criticado por comer carne, pois 99% da população come carne. “Mas essa pessoa começou a ficar agressiva e chegou até a afirmar que se dependesse dele, aquele bode não iria morrer naquele dia, e o que praticavam não era religião”, contou.

O babalorixá afirmou ainda que existe todo um preparo para que tudo ocorra da forma mais correta possível. Disse ter respeito e que inclusive tem cachorro em casa e que tem amor pelo animal e não faz sacrifício de nenhum animal doméstico, apenas Bode e galinha.

Comentou que não existe diferença entre comer a carne sacrificada perante aquele que acredita na sua fé, e comer a carne do açougue sem fim religioso nenhum. “Foi uma hipocrisia grande. Faltou respeito, saber lidar com as pessoas. Vi muita gente junto com ele (representante da ONG), que ficou do lado de fora, alguns inclusive vizinhos que já até frequentaram o templo”, explicou.

SITUAÇÃO SE CONVERTEU
EM INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

Hiago destacou ainda que acredita que a situação tenha se convertido em intolerância religiosa, pois as pessoas do Candomblé sempre sofreram perseguições. “Outras casas já sofreram muitas outras invasões. Inclusive, usaram da desculpa da pandemia, para tentar evitar que se fizessem cultos. Mas nós sempre vamos cumprir o que está na lei. Sempre terminando até no máximo as 22 horas. Nossos sacrifícios, inclusive são feitos de dois em dois meses”, asseverou.

E concluiu: “Fiquei chateado que tenha virado caso de polícia e saído na mídia, com a notícia de que os animais estavam lá para culto de magia negra. Isto é errado. Magia não tem cor. A mesma pessoa que te abraça, pode lhe apunhalar pelas costas. Não acreditamos que exista um Deus e um Diabo todo mundo tem um pouco dos dois. É preconceito achar que é coisa do mal tudo que é feito fora do cristianismo”.

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