26 de outubro | 2010

Lurdinha Alesse comemora 60 anos pintando com os pés

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Prestes a completar 60 anos de
idade e sem aposentadoria, a artista plástica olimpiense Maria de Lourdes
Alesse, Lurdinha Alesse, envia 10 obras a cada ano à Associação dos Pintores
com a Boca e os Pés, instituição fundada em 1956, no principado de
Liechtenstein, entre a Áustria e a Suíça.

É assim que, desde 1968, ela
se mantém com a venda dos quadros. Além de comercializadas, as obras também se
transformam em cartões e calendários, entre outros artigos. Lurdinha foi
destaque em matéria de uma página na edição do domingo, dia 24, do jornal
diário da Região de São José do Rio Preto.

Seu trabalho varia entre
reprodução de fotos, imagens do tradicional folclore de Olímpia, gravuras de
cavalos, bois e natureza morta. “Passo horas em frente à tela”, conta. “Também
gostava de fazer tricô, crochê e bordado. Até já costurei, mas a pintura é a
minha paixão”, acrescenta.

Atualmente ela trabalha em um
ateliê adaptado em um dos cômodos da casa de sua irmã, onde mora em Rio Preto,
desde o falecimento de seu pai. A superação é a palavra que move a vida da
artista plástica.

Nascida em Olímpia, em 10 de
novembro de 1950, Lurdinha, que está prestes a completar 60 anos, nasceu sem os
braços. Devido à má-formação, o médico não deu mais do que nove dias de vida
para o pequeno bebê, frágil e com debilitações visíveis.

Porém, a dedicação, o amor e o cuidado dispensado pelos pais e avós salvaram
Lurdinha e hoje ela é conhecida em várias partes do Brasil e do mundo por suas
pinturas. Com os pés, a artista faz qualquer tipo de desenho, principalmente
paisagens – seu tema favorito.

Até se profissionalizar,
entretanto, houve um período longo – em que precisou enfrentar muitos
obstáculos e vencer inclusive a si mesma, já que a doença (que ainda é uma
incógnita em sua vida) também deixou seu raciocínio lento

ASSISTA AO VÍDEO DO TViFOLHA GRAVADO EM 2007




INFÂNCIA
Na infância, morava em um
sítio em Olímpia. Até os cinco anos, se arrastava pela casa, o que obrigou seu
pai a comprar proteção para amenizar os machucados. Só depois desta idade é que
aprendeu a andar e a exercitar a flexibilidade com os pés.

A primeira surpresa da
família foi quando encontrou uma bacia de roupa com água no chão de casa e, por
instinto, começou a fazer movimentos como se estivesse lavando. “Quando olhei
para trás, vi todo mundo escondido, observando. Estavam chorando de emoção. Foi
quando perceberam que a falta dos meus braços não faria diferença nenhuma na
minha vida”, conta.

Na mesma época, Lurdinha começou a comer sozinha. A destreza e a habilidade que
a pequena apresentava, dia após dia, surpreendiam os mais próximos

A irmã mais nova, Marilene
Baffi, diz que as dificuldades da época foram suplantadas por muito amor: “Não
havia nenhum tipo de orientação. Meu pai, minha mãe e até eu e meu irmão, mais
novos do que ela, agíamos por instinto. E deu tudo muito certo. O amor supera
qualquer coisa”. Lurdinha concorda: “Papai e mamãe foram muito importantes na
minha trajetória”.

O primeiro incentivo ao desenvolvimento do dom artístico veio do avô Edmundo,
que a presenteou com material escolar. Fascinada com os lápis e papéis, desde então
não parou mais de surpreender a todos com obras tão belas.

Somente aos 7 anos, depois de
a família trocar a área rural pela cidade, é que Lurdinha entrou no grupo
escolar. A maior dificuldade, no entanto, era encontrar o equilíbrio para ficar
em pé. “Ainda bem que meu irmão ia comigo, porque eu caía muito. Mas ele e os
amigos de escola me ajudavam”, lembra.

Mesmo com toda dificuldade, estudou até a quarta série do ensino fundamental e
conseguiu se formar aos 14 anos. Foi nesta mesma época que uma de suas
professoras, a dona Ofélia, a incentivou a desenhar. “Ela ficava maravilhada
com os traços das figuras que eu fazia. No grupo escolar, eu adorava fazer mapa
e ficava mais perfeito que o da própria professora”, reforça.


A grande transformação em sua vida aconteceu ao completar 18 anos, quando
participou do programa Cidade contra Cidade, do apresentador Silvio Santos, na
extinta TV Tupi e foi vista na televisão.

Lurdinha foi chamada para
participar da Association of Mouth and Foot Painting Artists Worldwide
(Associação dos Pintores com a Boca e os Pés), onde se profissionalizou artista
plástica.

VAIDADE
Lurdinha faz questão de permanecer o tempo todo muito bem arrumada. Vaidosa,
ela não fica um só dia sem arrumar os cabelos e se maquiar. A irmã Marilene diz
que tenta brecar a artista, mas não consegue. “Eu não gosto muito de maquiagem
e falo para ela não pesar muito nas cores, mas não adianta. Ela adora”, diz.

 

A artista faz tudo sozinha, e com os pés. A irmã diz que é tudo adaptado para
ela não ter dificuldades em se movimentar. A vaidade também inclui os adornos.
Além de pulseiras e relógio nas pernas, usa anéis nos dedos. “A gente tem de
estar bonita, né?”, diz a artista.

E nesta semana, Lurdinha tem
um motivo a mais para se embelezar: é que ela dará uma festa, no próximo
sábado, pelos seus 60 anos: “Tenho muito o que comemorar. O médico disse que eu
teria só nove dias de vida, e eu estou aqui, prestes a completar 60 anos. Tenho
mais é que celebrar ao lado das pessoas que amo”. “Nunca a vi desse jeito. A
Lurdinha não fala em outra coisa”, diz Marilene, a irmã com que Lurdinha mora
há dois anos – desde a morte do pai.

HIPERMOBILIDADE
A falta dos braços proporcionou à
Lurdinha a hipermobilidade do corpo. Prestes a completar 60 anos, ela consegue
levar os pés à cabeça, sem qualquer dificuldade.

Segundo a fisioterapeuta
Neuseli Lamari, especialista em hipermobilidade articular, “o fato de ser
mulher ajuda muito a mobilidade, já que o homem tem menos elasticidade.”

A especialista explica que, sem um estudo aprofundado, é impossível avaliar
essa hipermobilidade. “Ela pode ter uma pré-disposição à flexibilidade, algo
que já tenha nascido com ela. Mas a artista também pode ter explorado os seus
limites. O cérebro também foi bastante exercitado. Qualquer ordem que a
Lurdinha dê, seja andar, pintar ou comer, ele (cérebro) sabe que terá de ser
feito com os pés.”

O motivo da má-formação dos membros superiores ainda é desconhecido. Uma das
possibilidades é que, durante o período embrionário, tenha faltado vitamina A
(ácido retinóico) para a formação do feto.

A artista acredita que o uso
do composto de talidomida – remédio muito utilizado na década de 50 contra
enjoo na gestação – seja a causa de sua doença.

No entanto, A Associação de Pessoas com a Síndrome de
Talidomida nega a hipótese, afirmando que Lurdinha nasceu antes do início das
pesquisas para a venda do remédio, em 1954.

 
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