20 de dezembro | 2010

Comerciante olimpiense acusado de tráfico internacional continua preso em SP

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O comerciante olimpiense,
Ciro Marcondes Lourenço Plaza, de 32 anos de idade, proprietário de uma
lanchonete na cidade, continua preso temporariamente na Superintendência da
Polícia Federal (PF), de São Paulo.

Ele foi detido com mais 21 pessoas no mês de novembro passado, acusado de
participar de uma quadrilha especializada no tráfico internacional de cocaína,
uma das maiores em atuação no país.

No domingo, dia 19, o jornal Diário da Região publicou extensa matéria contando
informações que obteve com a PF, principalmente os diálogos entre o grupo,
principalmente envolvendo o advogado de São José do Rio Preto, Massao Ribeiro
Matuda, de 44 anos.

“Dinheiro é bom, não importa
de onde vem”, inicia a reportagem mostrando ser uma frase do advogado, captada
em grampo da Polícia Federal, cujas gravações constam no relatório da Operação
Deserto, deflagrada pela PF em novembro.

Outras 21 pessoas haviam sido
detidas em flagrante durante as operações. São 7 mil páginas ao todo,
resultantes de 1 ano e 10 meses de trabalhos, que incluem a transcrição das
escutas, obtidas com autorização judicial.

Nesse período, a quadrilha movimentou pelo menos 3,9 toneladas de cocaína, dos
quais 2,6 foram apreendidas pelos policiais no Brasil no decorrer das
investigações. Toda essa droga passou pela região de Rio Preto, conhecida como
“Rota Caipira” da droga, com destino a São Paulo e Rio de Janeiro.

Como cada quilo era vendido por US$ 40 mil, em média, a quadrilha teve um
faturamento bruto estimado em pelo menos R$ 270 milhões no período. A
contabilidade não inclui as 24,4 toneladas de farelo de soja misturado com
cocaína apreendidas em maio pela polícia boliviana. A droga vinha da região de
Santa Cruz de la Sierra
por terra ou avião, e era despachada para a Europa e África escondida em
carregamentos de soja.

Os diálogos revelam que Massao era um homem cauteloso e extremamente
organizado. Evitava conversar ao celular com o restante do bando – preferia
telefones públicos ou a internet.

O advogado fazia a ponte
entre os irmãos colombianos José Isauro e Jesus Antonio Andrade Pardo, que
forneciam cocaína a partir da Bolívia, e os compradores estrangeiros, com
destaque para o croata Vidomir Jovicic, o Simon, e o nigeriano Christopher
Izebkhale, codinome Tony, ambos presos em flagrante com cocaína no decorrer da
operação.

Ao longo de 2009, Massao revela, nos poucos diálogos ao telefone, que a
quadrilha movimentava quantidade impressionante de cocaína. No dia 24 de
dezembro do ano passado, véspera do Natal, o advogado, também chamado de Chino
e Doutor, contabiliza com um dos integrantes do grupo a quantia de droga
negociada com Tony e Simon nos últimos meses: “Vieram 200 (quilos), 229, 300,
aí veio mais… 225”,
diz.

Um total de 954 quilos da droga, batizada com diversos selos, “com o objetivo
de identificar o respectivo fornecedor”, segundo relatório da PF

Um deles tinha a logomarca
Totto (852 quilos de cocaína pura com esse selo foram apreendidos em agosto
deste ano pela polícia boliviana)

Além das apreensões no
Brasil, a PF conseguiu ainda rastrear dois outros flagrantes no exterior de
droga da quadrilha de Massao. Um deles, 330 quilos, foi apreendido na
Inglaterra pela polícia britânica escondidos em boias usadas para a pesca de
lagosta.

Outras 24,4 toneladas da droga misturada com farelo de soja foram apreendidas
em maio em galpão de Santa Cruz de la Sierra. O grupo tentava trazer o carregamento
para o Brasil desde o início do ano.

DELÍCIAS DA VOVÓ
A droga, segundo a polícia,
seria entregue em um depósito de Mogi-Guaçu, onde a quadrilha cuidava da
abertura de empresa de exportação de frutas em calda da marca “Delícias da
Vovó” – a cocaína seria escondida dentro das latas e despachada para a Europa
pelo porto de Santos. O grupo também mantinha uma rota aérea, que passava por
pistas clandestinas da região de Rio Preto.

Os documentos da Polícia Federal não revelam detalhes da movimentação
financeira mais recente de Massao. De 2006 para 2007, dados da Receita revelam
que suas contas bancárias saltaram de R$ 41,5 mil para R$ 100 mil.

Em
2009, altos depósitos em sua conta (não revelados na investigação) chamaram a
atenção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que pediu
justificativas à agência bancária de Pereira Barreto, onde Massao residia antes
de se mudar para Rio Preto, conforme diálogos captados pela PF.

Segundo o jornal, a quadrilha liderada pelo advogado tentou driblar uma
possível tentativa de monitoramento pela PF com o uso de telefones públicos,
trocas rotineiras de celulares, encontros pessoais em São Paulo e conversas
por skype, sistema de conversa em viva-voz pela Internet.

Cabia
a Massao cuidar de toda a logística de comunicação do grupo. Segundo a PF, era
ele quem trocava os números de celulares da quadrilha todos os meses, a maioria
com cadastros frios, o que motivou sucessivos pedidos de interceptação da
polícia à Justiça Federal

Além
disso, conversavam em telefones públicos – o advogado usou orelhões em Rio Preto, Mirassol e
Pereira Barreto – e combinavam encontros pessoais na Capital, em hotéis de
luxo, postos de combustível, shoppings e em um bar na esquina da rua Ipiranga
com avenida São João, área central. Toda semana Massao viajava 600 quilômetros de
Pereira Barreto, onde morou até junho deste ano, até São Paulo.

Agentes da PF acompanharam boa parte desses encontros a distância, todos
descritos em relatórios com foto dos envolvidos. Em um deles, Massao entra com
uma mochila no banheiro de um shopping na companhia de Simon – suspeita-se que
Massao entregou dinheiro para o croata, que acabou preso em outubro deste ano
com 29 quilos de cocaína prontos para embarcar em navio no porto de Paranaguá
(PR).

CORUMBÁ
Massao também se deslocava com frequência para Corumbá (MS), na fronteira com a
Bolívia. Segundo a PF, o advogado viajava 800 quilômetros
entre Pereira Barreto e a cidade de Mato Grosso do Sul no seu carro, um Vectra,
para entregar aos irmãos colombianos José Isauro e Jesus Antonio Andrade Pardo,
fornecedores da cocaína, o pagamento feito por Simon – quantias que poderiam
chegar a R$ 1,1 milhão, conforme se depreende de diálogo entre o advogado e os
colombianos.

O objetivo, afirmam os policiais, era “evitar a participação de terceiros que
poderiam colocar em risco tal operação”.

De acordo com o delegado Ivo Roberto Costa, que comandou a operação, Massao foi
indiciado por tráfico internacional de drogas, associação para o tráfico e
tráfico de armas, já que no galpão que o grupo mantinha em Arujá (SP) foram
apreendidas granadas antitanque. O inquérito ainda não foi concluído. Todos os
22 presos em novembro permanecem detidos temporariamente na Superintendência da
PF na Capital.

Massao contava com um homem
de confiança na coordenação do transporte da cocaína da Bolívia até São Paulo.
Era Carlos Alberto Simões Júnior, o Carlinhos, também nascido em Pereira Barreto e
amigo de infância do advogado

No início da década, Massao
advogou para ele e a então mulher, a boliviana Cintya Lijeron Gomez, quando o
casal foi preso em flagrante com 48,8 quilos de cocaína.

Segundo o relatório da PF, assim como Massao, Carlinhos mantém negócios em Pereira Barreto. Coube
a ele negociar diretamente o transporte de 632,5 quilos de cocaína até uma casa
em Arujá, na Grande São Paulo. A droga foi apreendida pela PF em fevereiro
deste ano.

Antes, em novembro, os
grampos captaram diálogo entre Massao e Carlinhos, em que discutem o pagamento
de fretes (R$ 36 mil) e comentam o aumento da fiscalização policial ao longo da
estrada usada pelo grupo, chamada “caminho da roça”. “Não vem não, fica
quietinho”, comenta Carlinhos com Massao.

Ambos chegaram a se encontrar
em Pereira Barreto
para negociar a vinda de droga. Carlinhos acabou preso em Rondonópolis (MT), onde
mora, no dia 17 de novembro, quando foi deflagrada a Operação Deserto.

IRMÃO DO COMERCIANTE – SEVERÍNIA
Uma casa no Belvedere, condomínio fechado de classe média de Rio Preto, serviu
de quartel-general para o núcleo do esquema responsável por trazer cocaína da
Bolívia até a região por meio de aviões.

O imóvel foi alugado no
início do ano por Aderval Guimarães da Silveira, o Chiquinho, e por Marco
Antonio Lourenço Plaza, o Marquinho, que até então morava em Corumbá (MS).

Era lá que a dupla costumava se reunir com Antonio de Souza, o Toninho, que no
final de 2009 mudou-se de Severínia para uma casa locada no bairro Cidade
Jardim, para discutir as viagens de avião até a região de Santa Cruz de la Sierra, onde compravam
cocaína dos irmãos bolivianos Ronald e Marvin Escalante Lozano, fornecedores da
droga.

A aeronave, pilotada por Aderval, descia em pistas de pouso
clandestinas, no meio de canaviais, no leste de Mato Grosso do Sul e na região
de Rio Preto.

O passo seguinte, segundo a PF, seria levar a droga de caminhão para São Paulo
e Rio de Janeiro. Segundo vizinhos da casa, o entra e sai no local era intenso.
“Sempre tinha carrão, mas nunca conversavam fora da casa”, disse um deles, que
não quis se identificar.

Outro ponto de encontro do grupo, monitorado por agentes da PF, era a
conveniência de um posto de combustível no Jardim Primavera, zona leste da
cidade. Foi lá que eles se reuniram em 11 de agosto deste ano para discutir um
possível novo piloto para o esquema, uma vez que Aderval se negava a viajar à
Bolívia, temendo um possível flagrante.

Em 26 de maio, ele havia escapado de uma blitz da PF, ao arremeter voo no
aeroporto de Paranaíba (MS) – os policiais suspeitam que o avião estava
carregado com droga.

Em agosto, o grupo planejava
trazer um avião abarrotado com 270 quilos de pasta de cocaína até um canavial
da região de Rio Preto – o município não é revelado nas escutas da PF.

A pista, no meio de um canavial, foi escolhida cuidadosamente pelo bando, que
chega a temer a presença de cortadores de cana nas proximidades. “Muita
máquina, muita gente. Não tem como fazer”, diz Toninho.

O empecilho dos cortadores e da falta de piloto aparentemente foi logo
resolvido, porque em 24 de agosto Toninho viajou a São Paulo para negociar
pessoalmente com Marvin a vinda do carregamento de cocaína.

Dois dias depois, Marvin veio
a Rio Preto supervisionar os preparativos do voo até a Bolívia. Os dois irmãos
chegam a comentar a possibilidade de não caber tanta droga no avião. “Pode ser
que não caiba tudo (toda a droga no avião)… Disseram que vão fazer o
possível, mas com certeza cabe 250 (quilos de cocaína)”, diz Marvin. Toninho
assume o telefone e recebe a ordem de Ronald: “Rapaz, tem que pegar todo aquele
dinheiro (droga)”.

Aderval aceitou a empreitada, e no dia 28 de agosto ele e Plaza embarcaram no
avião comprado pelos bolivianos no aeroporto de Penápolis. Seguiram até Campina
Verde, no Triângulo Mineiro, onde o piloto montou base operacional “com assídua
realização de voos tendo como destino a Bolívia”

De lá, rumaram para a Bolívia, com escala para reabastecimento em Coxim (MS).
No dia seguinte, um domingo, eles retornaram para o Brasil, com nova parada
prevista para Coxim. Foi quando a PF abordou o avião, e encontrou 252 quilos de
cocaína escondidos na fuselagem.

Aderval, que já era procurado pela Justiça Federal do Rio de Janeiro por
tráfico internacional, e Plaza, foram presos em flagrante. Dias
depois, a PF fez blitz no Belvedere, e deparou com uma caminhonete Hummer,
importada e trazida da Bolívia por Aderval, provavelmente em pagamento por
cocaína. O veículo está avaliado em R$ 250 mil.

Mesmo detido, Aderval telefonou para a mulher Eliane Aparecida Noveli, de Santa
Fé do Sul, a quem cabia zelar pela contabilidade do esquema – segundo a PF, por
diversas vezes ela trocou euros e dólares por reais, “movimentando grandes
somas de dinheiro”.

O piloto pede para a mulher
cobrar US$ 100 mil de uma dívida de Toninho. “O dinheiro que tá devendo ele tem
que passar pra você senão você não trabalha”, diz Aderval. Eliane e Toninho
foram detidos no dia 17, quando foi deflagrada a Operação Deserto.

QUADRILHA
ABASTECIA O RIO

A
especialidade do grupo era exportar cocaína pura escondida em carregamentos de
farelo de soja. Mas uma pequena parte do entorpecente também era revendida para
traficantes menores do Rio de Janeiro e de São Paulo.

Em
abril deste ano, Angelo de Oliveira Manprin, um dos responsáveis pelo
transporte da droga da quadrilha, estabelecido na Capital, negocia com
traficante carioca, naquela ocasião ainda não identificado pela PF, o envio de 10 a 20 quilos por semana de
cocaína para o Rio.

O traficante carioca oferece R$ 10 mil pelo quilo da droga. Manprin fecha
negócio e manda o traficante buscar o entorpecente em São Paulo com um
caminhão.

O
interlocutor concorda e elogia a droga. “Se for dessa que veio de lá
(provavelmente Bolívia), pode vir a quantidade que for que compra tudo aqui”,
afirma. O homem que conversa com Manprin foi identificado posteriormente como
Bruno, dono de uma loja de veículos em Duque de Caxias, Baixada Fluminense.

Em outros casos, diz a Polícia Federal, a droga era transportada escondida no
painel de carros. Até 40 quilos do entorpecente eram transportados no
compartimento. Vários desses veículos eram de propriedade de um empresário dono
de duas revendas de automóveis no bairro São Miguel Paulista, em São Paulo.

Dos
sete estrangeiros alvos da Operação Deserto, apenas três foram presos: o croata
Vidomir Jovicic, o nigeriano Ugwu Charles Anayo e o boliviano Pedro Juan Jinete
Vargas. Os demais, incluindo os fornecedores colombianos e o comprador da
Nigéria, estão foragidos, e são procurados pela Interpol.

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