30 de abril | 2024

Vidas Secas e S. Bernardo

Compartilhe:

A Arte de Cancelar a Si Mesmo

Majô tem uma vida perfeita, assim como todos os influenciadores digitais aparentam. É bonita, carismática, está sempre nas manchetes de sites de fofoca e seu engajamento das redes sociais é enorme. A adolescente começou a fazer vídeos quando era criança, e agora um “publi” lucra mais do que ganharia se seguisse uma carreira tradicional. Porém, depois de uma denúncia anônima, seu canal do Youtube fica à berlinda, e ela desaparece da casa dos pais. Esse enredo marca novo livro infantojuvenil de Jacqueline Vargas, roteirista vencedora do Emmy Awards, principal premiação para programas de televisão do mundo. “A Arte de Cancelar a Si Mesmo” é o retrato dos conflitos de uma juventude que teve a individualidade moldada por números na internet. Aos 15 anos, a famosa mirim já precisa lidar com a ideia de sustentar toda a família, sofre com as dores de ter uma mãe narcisista e, por causa da profissão, não consegue manter amizades próximas. Entretanto, uma decisão muda a vida dela: enquanto todo o Brasil se pergunta o que teria acontecido à jovem, Majô está escondida na casa da vizinha Kauane – adolescente com um perfil completamente diferente da protagonista. A garota que mora na casa ao lado é introvertida, sarcástica, neurótica e com uma tendência a reclusão social. Porém, quando encontra a influencer na edícula do lar, surge uma amizade improvável. A partir disso, as duas revisitam as memórias de infância, compartilham frustrações sobre o futuro, ponderam sobre o peso das redes sociais na vida delas, experienciam primeiros amores e tentam encontrar formas de existir sem se prenderem às amarras do engajamento no mundo virtual. Nesta obra, a escritora entrelaça pesquisas sobre psicanálise em uma ficção para o público infantojuvenil. Entre as páginas, reflete sobre como a subjetividade dos jovens está conectada às redes sociais, pondera acerca das consequências do excesso de informações no cotidiano e questiona os limites entre o esquecimento e a necessidade de registrar as memórias na internet. O livro tem 203 páginas.

 

Uma Pitada de Sorte

No Brasil, estima-se que 2,9 milhões de indivíduos a partir de 18 anos se declaram lésbicas, gays ou bissexuais, segundo pesquisa de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas onde estão as histórias dessas pessoas na literatura, no cinema, na televisão? Embora as pautas queer agora sejam mais discutidas nos meios culturais, as escritoras Bruna e Gisele Baldassari sentiam que faltava representatividade sáfica no mercado literário, principalmente em histórias leves, repletas de comédia e romance. Casadas desde 2018, a dupla encontrou na escrita uma forma de dar mais visibilidade às narrativas românticas que gostavam de assistir na infância e adolescência, mas nas quais nunca se viam representadas. O hobbie se transformou em profissão e hoje elas já têm seis livros publicados em conjunto, todos voltados para o público jovem interessado em ler enredos que unem o romance à diversão e são focados na comunidade LGBTQIAP+. Último lançamento do casal, que assina sob o pseudônimo G. B. Baldassari, “Uma Pitada de Sorte” narra a jornada de uma jovem uruguaia que tenta se tornar uma cozinheira da alta gastronomia em Buenos Aires enquanto lida com os sentimentos pela chefe. Em entrevista, as autoras comentam as inspirações por trás da obra e reforçam a importância de levantar a bandeira da diversidade não somente nos livros new adult, como também por meio de projetos sociais que incentivam o protagonismo sáfico no Brasil.

 

Ayrton: O Herói Revelado

“Não é necessário lembrar. Cada brasileiro sabe. E muitos continuam sentindo, trinta anos depois, como foi aquele 1° de maio de 1994: o lugar onde estava, as palavras que pronunciou, o vazio que o capacete imóvel abriu no peito, a angústia do resgate inútil, os pés alinhados e caídos, a mancha vermelha no chão de cimento branco, o domingo desfeito em perplexidade e o baque definitivo, no meio da tarde, direto do Hospital Maggiore, em Bolonha”. São com estas palavras que o jornalista Ernesto Rodrigues e a editora Tordesilhas revisitam o livro “Ayrton: O Herói Revelado”. A edição, atualizada e contextualizada, abrange acontecimentos significativos ocorridos no período “pós-Senna” tanto no Brasil como na Fórmula 1.  “Verifico, com prazer, passados trinta anos da perda de Senna, que, além da veracidade, permanência e relevância do que Ernesto escreveu em 2004 […] ‘Ayrton: O Herói Revelado’, assim como Senna, continua importante, emocionante e inesquecível”, afirma o comentarista Reginaldo Leme. Nos quase 100 novos trechos inseridos no texto da biografia original estão relações amorosas; bastidores das temporadas em que ele dividiu a McLaren com o grande rival Alain Prost; a crise interna que precedeu o acidente polêmico na decisão do campeonato de 1990; as façanhas em Donington Park e no circuito de Mônaco; o terremoto provocado na família Senna por Adriane Galisteu. Contempla, também, uma contextualização da trajetória esportiva do piloto em comparação com os campeões que o sucederam, como Schumacher, Fernando Alonso, Sebastian Vettel, Lewis Hamilton e Max Verstappen. Para contemplar esse lado emocional e pessoal, o autor traz para a nova edição um relato do heptacampeão mundial de Fórmula 1, Lewis Hamilton. Na época do acidente, o então jovem piloto de kart de dez anos de idade chegava de mais um domingo nas pistas quando o pai, Anthony Hamilton, deu a notícia sobre a morte do piloto cujas façanhas ele admirava. Ernesto preserva e projeta a memória do piloto e dá uma nova dimensão à vida de Ayrton dentro e fora das pistas e aos acontecimentos que o consagraram um herói brasileiro. As palavras do biógrafo e dos mais de duzentos entrevistados vão além de depoimentos. Funcionam como acalento aos corações que ficaram órfãos do talento e carisma de Senna. O livro tem 512 páginas.

 

Vidas Secas e S. Bernardo

Considerado um dos melhores escritores de regionalismo do país, Graciliano Ramos é autor de dois livros essenciais para se compreender o Brasil, especialmente a região Nordeste: “Vidas Secas” e “S. Bernardo”. De forma inédita, os dois títulos são lançados em edição única pelo selo Temporalis, da Citadel Grupo Editorial. Publicada pela primeira vez em 1938, “Vidas Secas” é considerada a obra-prima do Velho Graça, como também era conhecido no meio literário. Este é um retrato intenso e desolador de uma família de retirantes nordestinos que enfrenta a fome, a sede, a opressão dos latifundiários e as injustiças sociais do Brasil rural. O autor expõe a luta pela sobrevivência em meio à seca e a exploração no sertão de Fabiano, Sinhá Vitória, os dois filhos e a cachorrinha Baleia. O sertão nordestino também é o cenário em “S. Bernardo”, romance que completa 90 anos em 2024 e é marcado pelo realismo e pela introspecção do protagonista, Paulo Honório, um homem rude e determinado a ascender socialmente por meio da posse de terras. No entanto, por trás dessa busca incessante por poder e sucesso material, ele esconde a solidão e a desilusão afetiva. Assim, o autor explora de forma profunda os desejos individuais, as contradições do ser humano e da própria sociedade. A escrita concisa e direta do alagoano, que foi repórter de jornais no Rio de Janeiro e prefeito de Palmeira dos Índios (AL), intensifica a sensação de aridez, desesperança e amargura transmitidas pelos personagens. Esta edição 2 em 1 de “Vidas Secas” e “S. Bernardo” chega ao mercado literário não apenas para unificar as duas obras, mas para tornar a coleção de Graciliano Ramos mais acessível aos brasileiros. O livro tem 240 páginas.

 

 

 

 

Compartilhe:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do iFolha; a responsabilidade é do autor da mensagem.

Você deve se logar no site para enviar um comentário. Clique aqui e faça o login!

Ainda não tem nenhum comentário para esse post. Seja o primeiro a comentar!

Mais lidas