31 de dezembro | 2017

Qual o futuro de Olímpia?

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“Amo as pessoas de alma rica, embora pobres de pão”.
(Ivo de Souza. Fragmentos do poema Aprendiz. In: Poemas – estrelas no chão, 2013).

João Victor Moré Ramos

De estação em estação, se regressa a velha boca do sertão. Da primavera ao verão, momento ímpar de sentir a influência do El Niño com suas chuvas demasiadas, ou da La Niña, que neste ano, mesmo com temperaturas baixas, promete chuvas contínuas. Não é de pouco lembrar os efeitos climato­bo­tânicos que outrora passamos aqui, das inúmeras enchentes na marginal cujas obras em infraestru­tura ou terminavam em pizza, ou carnaval. Ora, se não fosse o efeito estufa, e o aquecimento global não teríamos a quem recorrer, via tratado internacional, a uma nova mini era glacial. Por outro lado, no outono-inverno, quando as paineiras se abrem em flor, a imaginação no poder é motivo de beleza, quando não de amor. Nas mãos do Curupira, a capital nacional do folclore enchem os olhos de sonhos e esperança. Quem participa dessa festa mágica, muitas vezes não se da conta do privilégio incomensurável de ano após ano, poder conhecer as peculiaridades de nosso país e de nosso povo num único espaço. É conhecer cada pedacinho de nossa cultura diversamente ampliada em um grau de unidade, que possivelmente não há de se encontrar lugar igual no mundo.

Todavia, há que se notar que nesse solo do pioneiro imigrante nem só de sonho vive o homem. Basta um leve giro na cidade, para perceber os caminhos abertos pelo café, pela laranja, pela cana ao longo do século XX, e hoje, sobretudo pelas águas nos primórdios do século XXI. Com efeito, lembrando os grandes mestres da Geografia que estudaram nossa região ainda quando o dinamismo do povoamento era peça fundamental do desenvolvimento dos municípios paulistas, hoje, para nós, tal dinamismo no processo de industrialização de São Paulo já não explica em sua totalidade as transformações regionais do Oeste Paulista.

De fato, como bem lembrou o engenheiro de sólida formação geográfica, Américo Barbosa de Oliveira, um país, uma região, ou uma cidade que se quer realmente rica deve, sobretudo ter um Projeto Nacional (nesse caso, uma Plataforma de Cidade) de no mínimo três décadas para que se possa consolidá-lo. Um projeto que, aliás, além de ampla participação popular no enfrentamento dos nós de estrangulamento em infraestruturas, possa planejar a cidade do futuro elencando diretrizes capazes de dinamizar a economia local.  Ademais, investimentos externos são bem vindos, na medida em que nossa cidade não tenha capacidade de fornecer mão de obra, insumos e capital para o desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, faz-se mister descobrir nossas potencialidades, e identificar os setores com capacidade ociosa local a fim de promover uma maior acumulação diversificada com alto grau de planificação.

Disso resulta que deveríamos aprender com os chineses, grandes professores do planejamento de cidades metrópoles no interior de seu país, ao erguê-las em meio a desertos numa escala temporal de mais ou menos dois anos. Cidades jardins, altamente planejadas para o conforto de seus trabalhadores no deslocamento casa-trabalho, comércios e serviços ordenadamente construídos de acordo com necessidades pré-estabelecidas. Afinal de contas, a pobreza se nivela pelo tamanho do exército industrial de reserva inerte em cada região. E somente medidas eficientes no processo de urbanização são capazes de enfrentar as bolhas imobiliárias especulativas.

Nesse sentido, quais seriam as diretrizes centrais para uma política de planejamento estratégico e ordenamento do território olimpiense, nesse novo cenário mundial do desenvolvimento sustentável?

Seguindo os passos do ecossocioeconomista polonês Ignacy Sachs, uma nova concepção de desenvolvimento passa pela combinação de crescimento econômico, aumento igualitário do bem-estar social e a preservação ambiental. Dessa tríade, é que Olímpia pode encontrar o caminho mais frutífero de um permanente desenvolvimento, deixando para trás as lembranças dos períodos efêmeros das “vacas gordas” – quando tínhamos, por exemplo, Geremia Lunardelli, o rei do café, como prefeito da cidade, ou avançando mais no tempo, quando nosso arraial foi nacionalmente conhecido como a “Cali­fórnia brasileira” – devido à produção de laranjas.

Hoje, os tempos são outros. Com uma população em sua maioria urbana, as políticas públicas devem responder a altura aos desafios impostos pela cidade. Daí a combinação de turismo e questão social. Avançar nesse sentido é enfrentar com competência o grande papel de investimentos maciços em educação local. Há tempos que se ensaia por aqui a ideia de um gigantesco polo de conhecimento em Olímpia, com universidades federais, estaduais, etc., que possam capacitar nossa juventude queimando etapas de deslocamento. Não é demais lembrar as dificuldades de locomoção para realização de estudos e capacitações de nível superior em outras localidades e regiões que obstruem a aceleração do crescimento intelectual dos jovens (e do espírito da cidade) – muitas vezes obrigados a se qualificarem em outras cidades ou estados da União.

Por outro lado, a ousadia em criar um Vale do Rio Grande/Águas sertanejas nessa região deve ser lida como propositiva. O desafio maior são os gestores locais não se deixarem levar por um voluntarismo inepto, com um planejamento de curto prazo, ou melhor, dizendo, de eleição a eleição. Uma cidade que se quer rica, necessariamente precisa estar atenta aos modelos turísticos que fracassaram, e aos que foram vitoriosas ao longo da história e do tempo. No Estado de São Paulo é vasta a bibliografia, bem como as novas experiências regionais.

Hoje, o grande desafio posto para a nossa cidade é se adequar ao uso sustentável da exploração do Aquífero Guarani, acirrando a competitividade com as demais regiões turísticas do país, sem perder de vista o papel da poupança potencial capaz de dinamizar os investimentos em infraestruturas nos setores estrangulados de nossa economia. Sem planejamento estratégico das lideranças locais para pelo menos duas gerações subsequentes, Olímpia não terá encontrado ainda a ruptura com o caminho cíclico de acumulação, correndo o risco de a cada crise permanecer estagnada no tempo e no espaço. Trocando em miúdos, basta lembrar que o grande pólo de crescimento turístico liderado pelo clube Thermas dos Laranjais, surgiu das costelas da indústria/comércio – e não vice-versa. Ao fim e ao cabo, cabe às elites locais promoverem uma verdadeira substituição de importações na cidade e região, com políticas protecionistas que defendam os interesses do povo olimpiense contra a fuga demasiada de capitais.

João Victor Moré Ramos é doutorando no programa de pós-graduação em Geografia – UFSC. Este artigo foi elaborado após uma conversa com o Professor Ivo de Souza.

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