20 de março | 2016

Quadrilha é quadrilha. Acordem. A sociedade do ódio

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Luiz Fernando Cassilhas Volpe

Em meus 64 anos de idade, já tendo participado de inúmeros movimentos políticos e sociais, jamais testemunhei tamanho ódio, intolerância e insatisfação como o que vem ocorrendo, nos dias atuais.

A radicalização do ser humano tolhe-lhe a inteligência, a razão e mais especialmente a sensibilidade. A culpa é diri­gida, deliberadamente, para um grupo específico, cujo escopo é acobertar e tergiversar sobre os demais corruptos. As pessoas se digladiando, sem exatamente saber o porque. A emissora Globo transformou o JN num palanque político. Dita as regras.

Tomando como ponto de partida a análise de ideologias que são implementadas à uma sociedade, sempre com um único escopo: O PODER de dominação. Até aqui, nenhuma novidade, vez que a história da humanidade sempre demonstrou isso de forma absolutamente clara. Tal concepção jamais deixará de existir. O poder pelo poder.

Este sempre estará intrinsecamente interligado com a política, que também é um exercício diário de cada cidadão, muito embora muitos ainda não consigam ter essa compreensão. Não é necessário ser possuidor de um mandato para o exercício do ato político.

Quanto mais voltado para dentro de si mesmo, menor será a sua contribuição para uma sociedade justa e principalmente correta. Não tenho que me importar com que os outros fazem, mas sim com que eu faço para contribuir para uma sociedade melhor. Malba Tahan, em uma frase lapidar diz: “Os sábios educam pelo exemplo e nada há que avassale o espírito humano mais suave e profundamente, do que o exemplo.” 

Mas de onde vem tanto ódio?

De uma sociedade que vem sendo construída basicamente em alicerces econômicos. Onde o ter é muito mais importante que o ser. Onde o ter, mesmo que seja falso, prevalece como estímulo para as adversidades.

Onde a vitória ou a conquista seja alcançada, não se importando com os meios que foram utilizados. Onde a derrota não é compreendida como o resultado de que nem todos os competidores poderão sair vencedores. Uma derrota não torna ninguém menor, mas dela se poderá extrair ensina­mentos e aprendizado, dependendo da capacidade de compreensão do vencido.

Vencedor será aquele que travar sempre um bom combate. Vencedor será sempre aquele que tenta alcançar o seu sonho com lisura, honestidade e honradez. Vencedor será sempre aquele que suplantar o seu adversário, através e unicamente por seus méritos.

Vencedor será sempre aquele, em que seus pares se espelharem como sendo um bom exemplo. Vencedor será sempre aquele, cuja incolumidade de sua honra e seus princípios permanecer intacta. Vencedor será sempre aquele que mantiver a humildade, o respeito e a mão estendida a quem dela necessitar.

O conflito de interesses pessoais sempre poderá ser solucionado, pelo menos em sua grande maioria. O egoísmo jamais. Parafraseando o cineasta francês Claude Chabrol: “A estupidez é infinitamente mais fascinante do que a inteligência. A inteligência tem seus limites. A estupidez não.”

Mas como resolver o ódio enraizado na alma dos seres humanos. Sentimento que extraímos hodiernamente da política, do futebol, da religião, das etnias, das raças, das relações conjugais e de tantas outras relações. Qual a razão dessa sede de vingança sem limites? 

A meu ver, aí emerge a figura do Estado, esse ser abstrato criado exatamente como instrumento regulador da ordem e da paz social, configurado por entes políticos, como garantidor de igualdades, justiça e principalmente, preservação da dignidade do ser humano.

Senhor único de poderes normativos e imperativos, detentor exclusivo do direito de punir seus cidadãos, através de procedimentos pré-concebidos antes de qualquer ação humana. Inerente ao seu próprio fim, é o grande arrecadador de tributos, cujo escopo é o de garantir a todos indistintamente, o cumprimento de seus fins e a hegemonia social, na redis­tribuição de suas riquezas.

Exatamente neste ponto, quando esses princípios começam a ser alterados, por implementação de ideologias sob o crivo de interesses exclusivamente econômicos, sob a denominação de neo-liberais, ora sob o argumento de que o Estado deve ser “enxugado” ou sob o argumento da “ineficiência”, representa a forma sutil, de ardilosos membros da sociedade civil, como instrumento de apropriação do bem público. 

Chega a causar perplexidade a denominada “operação lava jato”. Não pela apuração em si, a qual deve ser apoiada por toda sociedade e mais, a apuração não pode estar restrita a um grupo específico, mas a todos os que estiverem envolvidos em “falcatruas”.

Mas pelos mecanismos que vem utilizado, pelas violações e medidas inquisitoriais tanto abominadas pela humanidade.

Violações a preceitos constitucionais, alguns dos quais, ratificados pelo STF. Relativização do princípio da inocência. Não. Houve a sua revogação.

A denominada delação premiada, incorporada ao ordenamento jurídico pela Lei 12.850/2013, vem expressamente estabelecida pelo legislador pátrio, em seu artigo 4º, que a mesma tem como pressuposto “a voluntariedade”, do ato praticado por aquele que agora resolveu se denominar de “colaborador”.

VOLUNTARIEDADE não é compatível ao animus daquele que é encarcerado e mantido nessa condição até que resolva “assinar” o termo em testilha.

Isso muito mais se aproxima das ORDÁLIAS do que de um ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.

A sociedade como um todo aplaude certos atos pirotécnicos, colocados à conta gotas, todos os dias. Explico.

Porque as “delações”, até mesmo antes de serem homologadas, são repassadas ponto a ponto para a imprensa. Novamente recorro a Lei 12.850/2013. Em seu artigo 5º que: “São direitos do colaborador: II – ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados; V – não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito.”

Lei ora lei. O circo vale muito mais. Então haveria em se indagar: Pode o magistrado, pessoa que deve sempre ser imparcial, sereno e principalmente equilibrado, cuja função principal é apenas cuidar dos autos e nele se manifestar, colocar-se no papel de divul­gador dessas informações? Estaria ele violando a Lei 12.850/2013???

É concebível um magistrado, a cada ato, enviar email a jornalistas? Quebrar o sigilo apenas para a imprensa, quando tal acesso é negado aos advogados, os quais, na sua grande maioria, tomam conhecimento pela imprensa? O magistrado pode tudo???

Finalmente, quanto a esse tópico, o artigo 7º, da lei supra citada preceitua em seu § 2o “O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das investigações,…” e em seu § 3o

“O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia, observado o disposto no art. 5o”. O que o legislador estabeleceu nestes dispositivos legais, devem ou não ser respeitados????

Agora houve a quebra do sigilo de uma escuta telefônica da qual faz parte a mais alta autoridade desse País. Pontual.

Qual a razão para tal divulgação, no exato momento em que o ranço está implantado? E o mais grave. Tinha o magistrado curitibano competência para isso ou essa competência havia cessado???? 

Se existem provas, não há qualquer razão para tal comportamento. O processo estaria pronto para ser julgado e fim. Querem fazer crer que pessoas estão obrigadas a produzir provas negativas. Isso não só extrapola o direito, mas também o bom senso. O ônus processual é perfeitamente delineado pelo ordenamento jurídico pátrio. Compete a quem acusa.

O mais grave. Amizades estão se dissipando face a esse clima de ódio. Pessoas não conseguem mais discutir qualquer idéia, ponto de vista, conceitos ou até mesmo expressar suas opiniões diante da cegueira descomunal e incompreensível do ser humano. Ódio, esse que é alimentado a cada minuto.

Ódio disseminado de forma orquestrada. Mídia diariamente recebendo informações privilegiadas. Mídia e Judiciário juntos.

Vale aqui transcrever um dos pensamentos de Votaire: “ Posso não concordar com nenhuma das palavras que dizes, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las.

Espero que a sociedade civil tenha o necessário discer­nimento para refletir sobre tal comportamento. Discutir idéias é fundamental, mas respeitar o posicionamento do seu semelhante é ainda mais. 

Lembre-se que a arrogância não o torna mais inteligente, mas a inteligência lhe faz mais humilde.

Luiz Fernando Cassilhas Volpe é olimpiense, advogado militante e professor de direito.

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