30 de junho | 2019

Público ou Privado?

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Otávio José dos Santos

A senda econômica vivenciada pelo município tem por destacada uma microeconomia regional que tem substrato a atividade do turismo, tanto pelo seu sentido comercial e de caráter privado, quanto pela sua natureza pública de desenvolvimento social e de responsabilidade administrativa do agente público governamental.

Sobre o primeiro aspecto, a atividade turística encontra-se fundamentada essencialmente pela atividade empresarial e mercantil voltada para produção e circulação de bens e serviços turísticos, compreendidos como todo serviço de lazer, de hospedagem, de natureza cultural, gastronômica e demais serviços correlatos colocados à disposição do mercado de consumo. Disso, pode se extrair que a produção e a circulação de riquezas desta natureza tem como potencial fundamental a capacidade de movimentação de uma economia local, driblando-se, muitas vezes, o cenário de crise nacional através da geração de empregos, das fontes geradoras de tributos, bem como com o aquecimento do consumo local em períodos sazonais.

Mas disto não basta o verniz de prosperidade que aparenta, pois mesmo que a autonomia privada seja o cerne da atividade turística como fator de produção econômico, também o é representado como dever público de regulamentação e fomento para o desenvolvimento econômico regional e social. Nesse passo, extrai-se o segundo aspecto do turismo como fenômeno público inerente a atividade administrativa pública de organização e otimização do potencial turístico para a implementação final da atividade privada.

Isso porque, é necessário identificar a funcionalidade do lazer em sentido lato ao patamar de mercadoria auferível de apreciação econômica e com isso levada ao mercado para consumo, resultando, na espécie, como atividade turística definida pelo fluxo de pessoas entre diferentes territórios, ao mesmo passo em que essa atividade transforma efetivamente o espaço político, cultural e social no qual está inserida, conjugando-se numa linha tênue as facetas pública e privada deste fenômeno em expansão no município.

A intersecção da natureza pública e privada do turismo verifica-se pelas formas efetivas de exploração de um determinado espaço físico, que atrai multidões e ao mesmo tempo estimula e requerem enormes investimentos em infraestrutura e construção de equipamentos públicos e privados para satisfazer a demanda decorrente desse fluxo de pessoas. É nessa tarefa que incide a responsabilidade pública da atividade turística, representada através de ações políticas e projetos de desenvolvimento urbano, envolvendo em seu dimensionamento todas as relações político-econômicas com o potencial de organizar e reorganizar os espaços públicos e privados voltados para a reconfiguração dos espaços urbanos do município de forma democrática.

Pode-se constatar, nesse aspecto, que a dinâmica das cidades que envolvem a atividade turística organizam-se principalmente em torno dos espaços privados que prometem qualidade de vida, prosperidade e segurança, tendendo-se afastar esses espaços da realidade e da demanda quotidiana da cidade, donde se extrai os revezes deste fenômeno, atingindo-se as áreas mais marginalizadas e provocando drasticamente a separação entre aqueles que podem consumir esses espaços ou empreender dentro de suas esferas e os que, excluídos deste processo de desenvolvimento, não são atingidos pelos benefícios desta atividade em expansão.

Prevendo-se, para tanto, o impacto econômico da atividade turística na esfera da competência pública de regulamentação dos espaços urbanos e dos fenômenos econômico-sociais decorrentes, a Lei Federal nº 11.771/2008 tratou de definir a Política Nacional de Turismo, estabelecendo diversas diretrizes desta atividade, dentre elas, chamando-se mais atenção para esta análise, aquelas estabelecidas pelos incisos II e VI do artigo 5º da referida lei, isto é, “reduzir as disparidades sociais e econômicas de ordem regional” e a “efetiva participação das comunidades recepto­ras nos benefícios advindos da atividade econômica”.

Como se vê, a preocupação do legislador na definição do Plano Nacional de Turismo está umbilicalmente ligada entre a confluência da face privada do turismo enquanto potencial econômico de determinado segmento, quanto a natureza pública na regulamentação planificada das atividades comerciais, assegurando a população local a participação direta e indireta nos benefícios deste fenômeno, desde a melhoria nos serviços públicos gerais até a promoção e o incentivo na implementação direta dos serviços turísticos, assegurando um ambiente econômico favorável para a implementação da iniciativa privada de forma racionalizada, desde o pequeno empresário ao grande capital investido.

Hoje, vive-se num ambiente marcado por mudanças constantes, dada a competitividade dos destinos turísticos, bem como pelos avanços tecnológicos, requerendo-se ampla sensibilização dos agentes públicos e dos segmentos empresariais para que este fenômeno se transforme em efetiva e constante atividade propulsora de desenvolvimento socioeconômico e, sobretudo, que de forma segura, possa conciliar o crescimento econômico com a preservação do patrimônio ambiental, histórico e da herança cultural, tendo igualmente como fim a participação das comunidades nas decisões do direcionamento dos recursos públicos aplicados e, por consequência, do seu próprio destino.

Otávio José dos Santos – Advogado, pós-graduando em Direito Civil pela USP – Ribeirão Preto.

 

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