27 de fevereiro | 2017

Onde estão o pudor e a dignidade?

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Ivo de Souza

Cada dia mais, nos assustamos e ficamos chocados com a atitude de certos políticos, os quais, há muito, “tomaram conta” do país – no pior sentido que isso possa significar.
O sr. Michel Temer se assemelha a um equilibrista de­sajeitado na corda bamba da insegurança (como se não soubesse muito bem o que fazer, quando fazer  e como fazer) – “fraco, titubeante, posu­do co­mo os necessitados de a­pa­rências enganosas”, segundo Jânio de Freitas, A8, poder, 16/2/2017, quinta-feira.

E parece não se importar nem um pouco com ações negativas (vide nomeação de Moreira Franco, claro esquema para livrá-lo de Sérgio Moro, presenteando- o com o foro privilegiado- um padrinho e tanto, não é senhores?).

E as realiza (as ações) sem, pelo menos aparentemente, pudor algum, sem nenhum constrangimento diante do povo brasileiro.

E o país vai patinando, quando urgem medidas a­firmativas, de força constitucional, medidas republicanas, pois a sociedade já não suporta arranjos de última hora, como se o próprio povo fosse um bando de ignorantes, enganados, facilmente, como ele pode supor. Não é bem assim, sr. Temer. Não é bem assim. Em um momento de tensão pura, desemprego em massa, caos instalado em alguns Estados,  nas contas públicas e na área policial, momento que exige absoluta seriedade e extrema postura ética e moral (no aspecto filosófico e na vida política cotidiana), não há tempo para ações frouxas, olhando só para o próprio umbigo, quando o povo pede seriedade em todas as decisões políticas, austeridade no trato dessas relações e no trato da coisa (dinheiro) pública.

Caso evidente de desrespeito à Constituição e à sociedade brasileira foi pro­tagonizado pelo seu Ro­me­ro Jucá, líder do governo no Congresso. O sr. Ju­cá teve a coragem (ousadia e desrespeito à dignidade do povo brasileiro) de apresentar emenda constitucional  (como se a Carta Magna fosse uma col­cha de retalhos!), a qual determinaria que os presidentes da Câmara e do Senado (hoje, Rodrigo Maia e Eu­ní­cio de Oliveira) e do STF só poderiam ser res­pon­sabiliza­dos por crimes que cometerem durante o man­dato – hoje a regrinha vale para o presidente da República.

Como é que um senador da República pode propor tamanha irresponsabilida­de, ou seja lá que nome possa ter um ato de tamanho desrespeito ao povo brasileiro, num tempo de profunda crise social?

A medida, só não enxerga quem não quer ver, poderia blindar os senhores Rodrigo Maia e Eunício Oliveira, citados, letra por letra, vírgula por vírgulas, em delações “daquela que comprava o poder no país”. Um ato oportunista, uma emenda de “ocasião”. Felizmente, não vingou.

Ficariam esses senhores livres de investigações por terem (supostamente) recebido propina – o crime teria acontecido antes deles se tornarem presidentes da Casa Legislativa e do Senado.

É nítida a intenção de Romero Jucá (o sr. Jucá, porém,  não teve sequer o capricho de disfarçar o objetivo da ação— é claro que ele afirma que não tem nada a ver com o intuito de atrapalhar a Lava Jato.

E, ingenuamente, tentou, simploriamente, des­pretenciosamente, explicar o sentido de tal e­men­da: dar o mesmo tratamento concedido ao presidente (o que já é uma medida discutível do ponto de vista da ética na política) da República aos presidentes (como essa palavra anda desgastada, oca, vazia, sem sentido algum em muitos casos!) da Câmara e do Senado. É o agente político escarnecendo do próprio povo. De forma arrogante, des­pudorada e, como já disse, sem nenhum constrangimento.

Ivo de Souza é professor universitário, poeta, colunis­ta, pintor e membro da Real Academia de Letras de Porto Alegre.

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