29 de março | 2020

Marco Rodrigues, Márcio Matheus, Bonduki e o medo dos saques

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Se ambos os olhares se entrecruzarem e notarem a necessidade um do outro para se complementarem no entendimento de que sem o humano não há necessidade de economia e sem economia, no mundo moderno e global, não haverá humanos, o consenso se fará.

Willian A. Zanolli
Após termos discutido a importância do turismo para a cidade e a necessidade de separar a discussão sob o tema dos deveres de cuidado com a população, que são inerentes ao poder executivo, vamos discutir o medo de saques.

Hoje iremos de expecta­dor visualizar, sob a ótica de outras pessoas, o que pode vir a ser o cenário futuro da economia brasileira e quais soluções deveriam ser apresentadas, na nossa opinião, para minorar o quadro.

Nas redes sociais, sob o manto da proteção dos mais fracos e preocupado com saques, o ex-vereador Marcos Rodrigues, o Mar­cão do Gazeta, postou o texto que avaliaremos e que segue abaixo, alvo de muitas críticas e alguns elogios.

“Os governantes estão brincando com a população. Dentro de 15 a 20 dias vão começar saques em mercados. Aí quero ver o que vão fazer. Sou comerciante, já estou com boletos atrasando e funcionários não receberão mais. Muitos pais de família vão ter que roubar para dar comida em casa. Vai ser um caos. Estou falando isso hoje e logo verão minha razão. Infelizmente alguns morrerão da doença, e muitos idosos por serem incon­se­quentes. Mas menos mal isso do que o desespero de várias famílias passando necessidade e tendo que saquear lojas e mercados para ter o que comer.

A maioria interpretou, e eu interpreto também, como péssimas as ponderações do ex-vereador, por passar a impressão de uma preocupação talvez exagerada com seu bem estar ofer­tan­do pouca ou nenhuma preocupação com a vida humana.

Principalmente no ponto em que afirma que “alguns morrerão da doença, e muitos idosos por serem inconse­quentes”, é muita crueldade e pouco amor pela vido do outro.

Não fosse pela forma, conteúdo, maneira de se expressar e por não apresentar solução para o dilema apontado, observo razão no tocante a saques, que já ocorrem provocados pela miserabili­dade da população mais fragili­za­da economicamente.

Marcio Matheus Gon­çalez, radialista bastante conhecido na cidade, se contrapôs ao posicio­na­mento de Marcos com o seguinte texto:

“Que se arrebente a Economia, o momento é de isolamento. O governador de Nova York, Andrew Cuomo, já parou tudo por lá, até as indústrias e disse. Essa crise econômica será longa e pra todos, mas o povo precisa ficar em casa isolado. Não estamos de férias, estamos em guerra”. A crise econômica não será no Brasil… será mundial. Todo recurso precisa ser investido no povo nesse momento e dane-se a economia”.

Embora não refute na totalidade a preocupação de Marcos, alinho ao pensamento de vertente mais humanista de Márcio, excluindo, obviamente, os excessos no tocante a que a economia se arrebente.

Muito embora os dois possam, em algum sentido, ser razoáveis em suas ponderações, um pela preocupação com o cenário econômico vindouro e o outro por colocar a vida como valor maior a ser preservado, foi no brilhante artigo de Nabil Bonduki, na Folha de São Paulo, que encontrei o equilíbrio que me agrada para as duas posições.

O título: Confinada, a classe média bate panelas; sem alternativas, os pobres farão saques.

Nabil entende, assim como Marcos e Márcio devem entender, mas não expressaram, que é urgente um plano emergencial para enfrentar a pan­demia na população vulnerável.

Bonduki faz interessante análise do quadro, aconselho que leiam o artigo.

Vamos nos ater a complementar o que a discussão de Marco Rodrigues e a intervenção de Márcio Matheus e outros poderiam ter apontado para evitar que haja saques.

Releitura remetendo a cidade de Olímpia. 

Segundo Nabil Bonduki:

“É necessário um plano emergencial para enfrentar a pandemia na população em situação de rua e nas favelas, cortiços e assentamentos precários, incluindo, entre outros os seguintes pontos:

Aplicação de testes do Covid-19, em massa, na população vulnerável para o imediato isolamento dos casos confirmados, se necessário, fora da moradia;

Requisição da rede hoteleira, e seus leitos ociosos, para isolar as pessoas contaminadas e que moram precariamente;

Suspensão de todos os processos de despejo (inclusive por falta de pagamento de aluguel), de corte de água e luz, assim como das ações de reintegração de posse de terrenos e prédios ocupados;

Instalação de torneiras, bebedouros e banheiros públicos, assim como rede de wifi gratuito em áreas com carência de saneamento;

Distribuição gratuita e regulada de produtos essenciais para garantir a higiene da população vulnerável, como sabonete, álcool gel, papel higiênico, máscaras de proteção, etc.;

Suspensão dos pagamentos de contas de água, luz e taxas nas áreas de vulnerabilidade social;

Garantia de uma renda básica emer­gencial que garanta, durante a calamidade, uma cesta de alimentação suficiente para todos os membros da família;

Para efetivar essas medidas é necessário um fundo social especial, taxando as grandes fortunas e os setores de alta renda.

Muito tem se falado sobre a necessidade de reduzir a desigualdade social. A pandemia, que provoca uma forte comoção, é uma oportunidade para dar esse salto.

A paciência com a ino­perância e falta de sensibilidade social do governo federal está atingindo um limite.

A classe média bate panelas todos os dias. Se nada for feito, os mais pobres, fortemente atingidos pela depressão econômica e, provavelmente, sentindo fortemente os efeitos do Covid-19 na própria carne, estarão mais preocupados com a saúde dos seus entes queridos e com a falta do que colocar nas panelas.

Daí para um cenário chileno, com saques e depredações, será um passo”.

Estas as ponderações precisas de Bonduki e daqui pra frente eu toco o bonde.

A título de justiça observamos que algumas ações já foram implantadas pelo prefeito Fernando Cunha que tem conduzido com excelência a discussão sobre a pandemia e discutido responsavelmente as possíveis soluções para enfrentar a doença.

 No tocante a classe empresarial, principalmente ao pequeno empresário, toca ao governo federal a não os deixar desas­sis­ti­dos em suas dificuldades que serão muitas.

Não é preciso repetir a necessidade de injetar dinheiro na economia como vêm fazendo os países da Europa e Estados Unidos para reverter o quadro econômico que se desenhará após o enfrentamento da pandemia.

Abertura de linhas de créditos com juros baixíssimos a perder de vista. Perdão de dívidas ou protelamento das mesmas, diminuição de cargas tributárias, ajuda no pagamento de folha de salário, diminuição na carga de impostos, flexibilização no pagamento de tributos e outras facilidades para a rápida recuperação do mercado.

Esta discussão de intervenção estatal nesta hora de crise mundial tem que ser deixada de lado. É necessário ter um olhar mais agudo sobre o humano como pleiteia Márcio e um olhar econômico como insinua Marcos.

Se ambos os olhares se entrecruzarem e notarem a necessidade um do outro para se complementarem no entendimento de que sem o humano não há necessidade de economia e sem economia, no mundo moderno e global, não haverá humanos, o consenso se fará.

Esta a principal razão pela qual entendo como extremamente necessário a que se abandonem os discursos dos extremos e se finque pés e cabeças, sentimentos e razão na mesma disposição de lutar em prol de que as necessidades se completem tanto do ponto de vista econômico quanto do ponto de vista humano.

Assim sendo, se assim for, todos terão razão

Willian A. Zanolli é artista plástico, jornalista e advogado. 


 

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