27 de outubro | 2019

Eleição do Tutelar confirma que somos Admiráveis Gados Novos?

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“Não basta ver. É preciso enxergar com os olhos da história, da filosofia, da ciência. É preciso dissecar os fatos, entender o contexto, interpretá-los, compará-los, para poder construir a tese, o conceito, o julgamento mais próximo da realidade. Quanto menos linguagem, quanto menos conhecimento, quanto menos capacidade de refletir, mais nos tornamos escravos das mentiras, das distorções da realidade, das narrativas criadas por uma minoria para dominar a maioria: O admirável Gado Novo do poeta do apocalipse”.

Mestre Baba Zen Aranes.

“Vocês que fazem parte dessa massa

Que passa nos projetos do futuro

É duro tanto ter que caminhar

E dar muito mais do que receber

E ter que demonstrar sua coragem

À margem do que possa parecer

E ver que toda essa engrenagem

Já sente a ferrugem lhe comer

Lá fora faz um tempo confortável

A vigilância cuida do normal

Os automóveis ouvem a notícia

Os homens a publicam no jornal

E correm através da madrugada

A única velhice que chegou

Demoram-se na beira da estrada

E passam a contar o que sobrou!

O povo foge da ignorância

Apesar de viver tão perto dela

E sonham com melhores tempos idos

Contemplam esta vida numa cela

Esperam nova possibilidade

De verem esse mundo se acabar

A arca de Noé, o dirigível

Não voam, nem se pode flutuar

Êh, ô, ô, vida de gado

Povo marcado

Êh, povo feliz!

 

SE VOCÊ CONSEGUIU …

… ler a letra desta música do poeta do apocalipse, Zé Ramalho, e entendeu o que ele quis expressar, beleza, como diriam os mais jovens. Mas, se você leu, e conseguiu entender apenas alguma coisa, também beleza. No entanto, se você não entendeu nada ou teve preguiça de ler, com certeza, você se encontra entre os milhões de brasileiros a quem ele dedicou esta música que, embora tenha sido escrita há décadas, continua atual, ou parece que foi feita para narrar os momentos presentes.

COMO DISSE …

… o grande Silvinho Facetto, comentando as palavras do irmão deste colunista, Mestre Baba Zen Aranes, publicadas como “olho” desta coluna: “Toma um ‘soma’ pra relaxar”.

É QUE, EMBORA …

… não tenha ouvido do próprio Zé Ramalho que a letra desta música foi feita em cima do livro o “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, várias tentativas de interpretação ou de decifrar o poema musicado do cantor levam ao entendimento de que ele tenha se inspirado nesta obra, junto com outras que versem sobre temas parecidos.

FACETTO …

… no caso citado acima, destaca que os personagens de Huxley tomavam uma droga chamada “Soma” quando se sentiam deprimidos (o efeito causava sensação de euforia, felicidade) e utilizou esta metáfora para falar que o irmão do colunista estava viajando na Maionese, mas concordando que não só o livro escrito há quase 100 anos, assim como a música de Rama­lho, há 30, continuam atualíssimos, como se tivessem sido escritos hoje”.

ZÉ RAMALHO …

… nessa canção faz uma poderosa crítica ao governo militar (foi lançada em 1979), que deu as costas para o povo do campo, transformando-o em sem terras, a margem da sociedade, a mercê da ignorância, alienação, violência e principalmente de acabar passando o resto da vida de uma prisão psicológica ou real, ou seja na escravidão atual que faz com que seres humanos vivam apenas pela mera sobrevivência, para poder sustentar o luxo e a felicidade de uma minoria e o que é pior, achando que apenas sobreviver é uma dádiva divina proporcionada pelas migalhas jogadas pelos detentores do poder econômico.

NA ANALOGIA …

… “facetiana”, Baba Zen, estaria sob o efeito de alguma droga para construir frases tão ininteligíveis para uma grande maioria que não tem direito a um melhor conhecimento da linguagem que pode levar o ser a ser humano.

MAS, NO DIA A DIA, …

… da mesma forma que no Admirável Mundo Novo, ou no Admirável Gado Novo, vivemos sendo enganados por uma ideologia que faz com que endeusemos e torçamos por aqueles que nos es­pe­zinham, pois só com o acúmulo cada vez maior de riquezas de uns poucos é que sobrarão mais migalhas para fazer com a que a maioria consiga a mera sobrevivência, que é obrigada a pensar como sendo a justa.

AÍ É QUE ENTRA …

… a droga “Soma” citada por Silvio, nos dias atuais. Drogamo-nos religiosamente para esquecer que somos meros escravos de um sistema comandado por vagabundos que colocam na nossa cabeça que não podemos ser como eles, temos que capinar quintais, apanhar laranja, colher cana, limpar a sujeiras dos senhores de engenho, pois sobreviver é a felicidade que nos é possível.

AÍ, ENCHEMOS A CARA …

… (nos drogamos, literalmente) todos os finais de semana para esquecer que vivemos dias de cão e que o que nos espera é mais trabalho, trabalho e trabalho, pois o mundo não abriga vagabundos, só aqueles que têm dinheiro para comprar o suor dos alienados (este seria o seu maior trabalho), mas estes se esforçam com a responsabilidade de fazer os pobres produzirem cada vez mais, como forma de construir um mundo mais justo … para eles.

E OS DIAS PASSAM, …

… envelhecemos matutos, apenas enxergando através da pequenez que nos impõe os tapa-olhos que nos levam a seguir as rédeas dos poderosos, aceitando as migalhas como se dádivas divinas fossem.

MAS, AÍ …

… poderia perguntar o nobre leitor: o colunista também tomou o “soma” de Huxley? O que tem isso tudo a ver com a eleição do Conselho Tutelar?

ELEMENTAR, …

… meus nobres leitores. Milhares vendendo o voto e fazendo aquilo que os vagabundos que vivem a sugar o seu sangue mandam, o que é? E isso vai continuar acontecendo por muito tempo.

José Salamargo – Apenas concluindo perguntando: somos ou não somos o Admirável Gado Novo do Zé Ramalho? E vivendo no Admirável Mundo Novo do Aldous Huxley? Fique a vontade para xingar o colunista, a mãe dele, dona Sofia, que “oitentou” na semana que passou, ou assumir que somos escravos ou meros zumbis pululando pelas ruas desta cidade, achando que algumas gotas de sangue são suficientes para a construção da nossa felicidade. Se quiser entender direito, fique a vontade para ler novamente a coluna. Este jornalista pede licença, mas tem um monte de “Soma” aguardando na geladeira para poder esquecer tudo isso …

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