22 de março | 2015
Aspectos solenes da marcha contra a corrupção
Do Conselho Editorial
As marchas levadas a efeito pelo país afora mostraram algumas situações em nada compatíveis com o que se estava em síntese pedindo.
Em primeiro lugar, abandonaram, ou relegaram para um segundo plano o pedido de impeachment da presidente, algo que, além de não condizer com o espírito da democracia, não encontra amparo na Constituição, tese abraçada e admitida até pelo presidente da Câmara que é rival da atual ocupante do Palácio do Planalto.
O pedido de volta à ditadura por falta de democracia em uma manifestação em que os excessos por si só demonstram o contrário, chega a ser risível.
Mais risível ainda, e circula na internet é a quantidade de corruptos e de condenados por improbidade administrativa levando bandeiras e cartazes contra a corrupção.
A sensação que se tem é a de que de repente o país concluiu que a corrupção tem que ser abolida da vida pública e privada.
Até médicos que vendem recibo para abater do imposto de renda estavam nas passeatas, acompanhados dos que cobram a operação por fora e lançam na planilha do SUS.
Os que contratam com o poder público e não prestam serviços também foram, e trocavam afagos e simpatias com os que fornecem notas frias.
Não poderia faltar os representantes dos Conselhos Federais das mais diversas categorias que não punem os associados venais por corporativismo, e faziam coro no abaixo a corrupção com os sindicalistas que vivem da contribuição sindical e do desvio delas.
Os que exploram as rodovias e financiam campanhas políticas trocavam figurinhas com os representantes de Oscips que fingem que prestam serviços nas áreas de Saúde, Educação e Assistência Social.
Os políticos compareceram só que como são alvos do protesto foram impedidos de falar, já mandaram recados nos bastidores de que muita gente honesta será retaliada nas próximas licitações se ocorrer o mesmo nas próximas manifestações.
Isto, deve ter sido mais que suficiente para que os donos da indústria farmacêutica tenha mandado um recado avisando que desta maneira o capitalismo perde o interesse de financiar o movimento e as redes de televisão e os jornais, nas entrelinhas, deixam o entendimento de que não há interesse da divulgação se o fato não tiver vínculos políticos.
As grandes empreiteiras não foram, e pelo que se sabe a intenção não é de maneira alguma retaliá-las pelo tanto de bem que fizeram à economia do país, e pelo reconhecimento de que se não fosse elas não haveria este tão distinto movimento.
Funcionários em cargos em comissão, e pretendentes a ingressar no funcionalismo através da famosa burla de concursos, podem não gostar de comparecer ao serviço, mas foram cumprir sua obrigação cívica de combate a desmandos.
Deputados e Vereadores que compram votos, assim como eleitores que vendem o voto e sua cidadania, foram as ruas mostrar suas indignações contra este câncer que acaba com o país.
Não faltou patrão que não recolhe e nem reconhece direitos trabalhistas, patroas escravocratas, e empregados que roubam as dispensas e assaltam geladeiras.
Governadores, prefeitos, senadores, deputados inelegíveis por improbidade também foram; mudar é necessário, tanto que compareceram até caminhoneiros que mudam suas rotas para não pagar pedágios.
Jornalistas que se vendem para o poder anunciaram este novo tempo de honestidade, e os cidadãos que compram o policial corrupto, que sonegam imposto, que passam cheques sem fundos, que furam a fila, que esperam sua vez de ter vantagens, acreditaram piamente que esta é a hora da mudança.
O lixeiro que distribui o cartão de natal que deixa o dono da casa preocupado pois se não der a “gorjeta” não terá o lixo recolhido foi com o cobrador de ônibus que nunca tem troco para ficar com a diferença e lá se juntaram aos donos de loja que anunciam com um centavo a menos e donos de supermercado que renovam validades de mercadorias por vencer.
Toda gente que é séria estava lá perdida no meio de um ou outro que poderia até não ser tão sério assim, por acreditar na seriedade de movimento contra a corrupção onde os maiores estimuladores da corrupção são exatamente os cidadãos que participam direta ou indiretamente do processo.
Estavam lá todos os que sempre exploraram as fragilidades do sistema para se beneficiar de alguma forma ou maneira pedindo exatamente o que não gostariam de ter, já que serão atingidos pelo que pedem, caso a honestidade, a seriedade, fossem instaladas no país.
Se gritar pega corrupto neste país, fica algum meu irmão?
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