25 de junho | 2022

A expressão, o “achismo” e a interpretação da realidade

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“Nenhuma sociedade pode ser livre e justa sem jornalistas capazes
de investigar irregularidades, informar os cidadãos e
responsabilizar os líderes”.
Maria Ressa, jornalista nas Filipinas.

 

PODERIA ESTE …

… ser, este “escriba” do apocalipse, sem muito ter falado do próprio, refletir sobre o atual momento que vive esta cidade que hoje comemora o dia de seu padroeiro, São João Batista.

OCORRE QUE, …

… para um agnóstico é muito difícil falar de alguém que foi santificado, mais ainda sobre quais as possíveis “bênçãos” que este pode lançar sobre esta cidade que hoje passa por uma transformação de face e de alma, com a chegada de milhares de novos moradores vindos de outras regiões do país para trabalhar no turismo.

MAS, JÁ QUE …

… no início do mês foi comemorado também o Dia da Liberdade de Imprensa que surgiu há 45 anos, quando mais de 3.000 jornalistas assinaram um manifesto exigindo imprensa livre e o fim da censura no Brasil. À época, vivíamos a ditadura militar (1977), que só terminaria 8 anos depois, mas a tomada de posição naquele 7 de junho foi o motivo para o Brasil celebrar o Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, profissão que tem sido opção para os corajosos, pelos altos riscos implicados em seu exercício.

A COMUNICAÇÃO, …

… no entanto, é algo intrínseco ao ser humano. Afinal, o homem é um ser social e essa sociabilidade se dá por meio da comunicação. Essa comunicação se dá de diversas formas, nas mais variadas manifestações, e uma delas é a liberdade de imprensa.

NO BRASIL, …

… a imprensa surgiu em 1808, após a chegada da família real portuguesa. Porém, somente 80 anos mais tarde, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que foi garantida a liberdade de imprensa, assim como a liberdade de expressão.

SOBRE A DIFERENÇA …

… entre liberdade de imprensa e de expressão, merece destaque a explicação da professora do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Karina Gomes Barbosa, que é doutora em Comunicação Social, para quem a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa (ambas garantidas por lei), embora busquem o fortalecer da cidadania, tem diferenças intrínsecas.

“A PRIMEIRA, …

… é a liberdade de emitir opiniões, ter acesso e transmitir informações e ideias, por qualquer meio de comunicação. Já a segunda decorre do direito de informação e diz respeito à possibilidade de o cidadão criar ou ter acesso a diversas fontes de dados, tais como notícias, livros, jornais, sem interferência do Estado”.

SEGUNDO ELA, …

… é comum a confusão desses conceitos porque eles têm a ver com a participação na esfera pública, com a possibilidade de qualquer um emitir suas opiniões a partir de uma série de garantias de que não vai ser censurado, não vai ser perseguido e vai ter um ambiente de expressão.

A DEFERENÇA …

… básica, para a professora, é que liberdade de imprensa diz de uma atividade profissional do jornalismo, regida por uma série de princípios, de fundamentos éticos e técnicos. Então, a liberdade de imprensa diz respeito à liberdade de o jornalismo ser exercido com ampla liberdade numa sociedade democrática. Existem diversas formas do fazer jornalístico, mas nem todo cidadão que está se expressando livremente exerce liberdade de imprensa.

ENFIM, …

… todo jornalista ou toda jornalista que está se expressando e exercendo sua profissão — sem amarras, sem interferência do Estado e dentro dos preceitos das garantias constitucionais — está exercendo a liberdade de imprensa.

JÁ O SOCIÓLOGO …

… Muniz Sodré, em um de seus artigos para a Folha de São Paulo, com o tema “As duas faces da liberdade”, vai adentro do tema discutindo essa liberdade tão disfarçada que tem provocado, inclusive, muitas mortes.

SEGUNDO ELE, …

… um paradoxo sombrio vem sendo soprado pelos ventos do liberalismo: quanto mais se fala em liberdade de expressão, mais se voltam as costas à liberdade de imprensa. É mundial o cômputo de prisões, mordaças e assassinatos de jornalistas.

SODRÉ parte …

… sua análise de pequenos exemplos nos EUA, cuja Primeira Emenda é suporte clássico para a imprensa liberal. Dados oficiais mostram que mais de cem repórteres foram presos e processados em 2020 simplesmente porque cobriam protestos pelo assassinato de George Floyd. As ações terminam derrubadas por tribunais, mas sua multiplicação é sintoma da tendência de criminalizar a mera rotina jornalística por parte de autoridades.

UM CASO MODULAR …

… dize ele, se deu quando um juiz da Carolina do Norte, durante semanas, sem qualquer explicação, proibiu o acesso de jornalistas ao tribunal. Ante o protesto de um editor local, o juiz mandou expulsá-lo algemado do prédio, ameaçando-o de desacato. Os incidentes se acumulam, junto com as preocupações de analistas e advogados da liberdade de imprensa, que veem em tudo isso “passos para a autocracia”. Há também quem considere que a recorrente demonização de jornalistas como “inimigos do povo” por parte de Trump tenha contribuído largamente para esse estado de coisas.

MUNIZ SODRÉ …

… faz questão de destacar, no entanto, que o fenômeno é bem mais complexo que isso.Primeiro, a informação pública, apesar de todos os avanços técnicos, permanece aquém do fulgor obtido no passado do liberalismo pela imprensa afinada com a cidadania.

SEGUNDO, …

… a diversidade das movimentações de massa em diferentes regiões do mundo evidencia o esgotamento dos processos clássicos de integração da cidadania no todo social. Esvai-se o “pacto fiduciário” de sustentação da sociedade, abrindo-se portas às autocracias e ao potencial conectivo das redes eletrônicas. Nelas, o que importa é o alcance do poder de mobilização.

LIBERDADE …

… de expressão, conceito chave da Declaração dos Direitos do Homem, converteu-se, assim, em álibi individual para publicizar a esfera incivil da vida privada. Não é jornalismo, pois não requer, como no caso da liberdade de imprensa, conteúdos racionais ou institucionalmente coerentes. Conta certamente com o fervor delirante de usuários da rede, que não são cidadãos pautados por responsabilidade social, e sim pelas perversões narcísicas da fala. Apenas como a outra face do valor democrático a expressão é realmente livre.

POR ISSO, …

… não se deve confundir liberdade de expressão com liberdade de imprensa, pois ambas têm naturezas distintas. Enquanto a liberdade de imprensa nasce da reivindicação de profissionais do jornalismo, que têm pautas baseadas na sua experiência na área, a liberdade de expressão é pautada na possibilidade de qualquer cidadã e cidadão em se manifestar – seja com uma ideia, ideal, história, arte, trabalho, protesto.

A PRINCIPAL …

… função do jornalismo é agir em prol da sociedade, tendo um compromisso único com o interesse público. Uma imprensa séria fornece as informações, os fatos, as interpretações da realidade necessárias para que o público tire suas próprias conclusões e se “autogoverne”.

CABE À IMPRENSA …

… livre, ser a voz dos “sem voz”, de denunciar irregularidades e injustiças. De buscar aquilo que nem sempre está às claras e, para isso, precisará investigar. Sem liberdade em contrariar interesses, seja de pessoas importantes, de empresas poderosas ou de governantes, ou dos próprios “opinadores” das redes sociais, o jornalista não conseguirá exercer essa parte da sua função profissional.

José Salamargo, preocupado com o avanço do “achismo” e o distanciar cada vez mais sentido daqueles que podem exercer a reflexão crítica, o interpretar dos fatos com mais detalhes e dentro de um consenso daqueles que dedicaram suas vidas pensando e tentando buscar as respostas que a maioria prefere não ouvir.

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