13 de julho | 2014

Juiz nega quebra de sigilo e extingue processo de enriquecimento ilícito contra prefeito de Olímpia

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O juiz da 3.ª Vara de Olímpia, Sandro Nogueira Barros Leite (foto), negou o pedido de quebra de sigilos bancário e fiscal feito pela promotora Valeria Andrea Ferreira de Lima, titular da 2.ª Promotoria de Olímpia, e extinguiu o processo que investigava provável enriquecimento ilícito do prefeito Eugênio José Zuliani (foto) e mais 11 pessoas.

A decisão, em três laudas, com data da segunda-feira, dia 7, se refere ao processo número 0004958-08.2014.8.26.0400.

Segundo o que consta na decisão, o juiz fez questão de ressaltar que não comunga do “entendimento do Ministério Público de que se trata de medida administrativa que não suporta o contraditório”.

Por se tratar de procedimento administrativo investigatório do Ministério Público, de acordo com o juiz “não desnatura a necessidade de intervenção judicial, que por imperativo constitucional impõe o contraditório”.

Ressalta também que no processo penal as medidas cautelares são deferidas sem a participação do investigado, mas que existe o controle judicial quanto à investigação, “uma vez que não promovida a ação penal, mas sim a promoção de arquivamento do inquérito policial, não concordando, pode o juiz encaminhar os autos ao Procurador Geral da Justiça, na esfera estadual”.

“Diferentemente, no âmbito civil, não há tal controle, de modo que o processamento da medida pretendida tem natureza cautelar nominada, no caso, exibição de documentos, nos termos do art. 844, II, do CPC”, acrescenta.

De acordo com Sandro Nogueira Barros Leite, a quebra de sigilo fiscal e bancário é admitida, excepcionalmente, nas hipóteses em que se denotem a existência de interesse público superior, “posto proteção não consubstanciadora de direito absoluto a sobrepor-se ao interesse coletivo”.

INSTRUMENTO EFICIENTE

“Inequívoca a intenção do legislador em tornar a quebra do sigilo bancário instrumento eficiente e necessário nas investigações patrimoniais e financeiras tendentes à apuração da autoria dos atos relacionados com a prática contra o erário de condutas ilícitas, como soem ser a improbidade administrativa, o enriquecimento ilícito e os ilícitos fiscais”, cita um dos parágrafos da decisão.

No entanto, o juiz alega que o sigilo bancário não tem conteúdo absoluto, devendo ceder ao princípio da moralidade pública e privada, este sim, com força de natureza absoluta. “A regra do sigilo bancário deve ceder todas as vezes que as transações bancárias são denotadoras de ilicitude, porquanto não pode o cidadão, sob o alegado manto de garantias fundamentais, cometer ilícitos”, reforça.

O juiz avisa que o sigilo bancário é garantido pela Constituição Federal como direito fundamental para guardar a intimidade das pessoas desde que não sirva para encobrir ilícitos: “Todavia, os elementos constantes dos autos não autorizam o deferimento da medida pretendida”.

EMBASAMENTO DA AÇÃO

De acordo com a decisão, a promotora Valeria Andrea Ferreira de Lima se baseou em duas cartas apócrifas encaminhadas ao Ministério Público, acusando, no centro, o Secretário de Finanças de Olímpia, Cleber José Cizoto. Por serem superficiais foi instaurado procedimento preparatório de inquérito civil.

As denúncias anônimas falam em construção de escritório com equipamentos de ponta e edificação de imóvel pelo referido secretário municipal.

“Todavia, o Ministério Público se limita a juntar notícias veiculadas em diário virtual de Olímpia acerca da inauguração do escritório, mas nada diz sobre a propriedade dos imóveis, ou seja, não está demonstrado que os imóveis são de propriedade de Cleber, o que é possível com certidão imobiliária”, observa o juiz em outro trecho.

O juiz afirma também que “mesmo que não esteja o imóvel registrado em nome de Cleber, para construção se faz necessário alvará municipal, também não exibido. Sequer há alguma notícia sobre a edificação do imóvel residencial, nem por auto de constatação”.

Também segundo o juiz, a promotora “limita-se também a juntar o comprovante de rendimento auferido como Secretário Municipal, mesmo sabendo que ele tem outra fonte de renda”.

“Sobre as empresas que tem participação dos envolvidos, em nenhum momento restou demonstrado que contrataram com a municipalidade. Sequer cópias dos processos de licitação foram exibidas”, acrescenta.

PROVAS FRÁGEIS

No entendimento de Barros Leite, “as provas carreadas pelo Ministério Público são extremamente frágeis, sem consistência mínima de que fraudes estão sendo perpetradas e os envolvidos recebendo propina”.

Além disso, afirma que a promotora “juntou pesquisa de fornecedores existente no portal do cidadão, sem indicar que os valores estão superfaturados ou que existe tal possibilidade, enfim, nada a indicar a prática de ato de impro­bi­dade”.

Diz também o juiz que “a investigação é importante e o papel do Ministério Público é fundamental. Contudo, para o deferimento de medidas extremas não basta meras conjecturas. Faz-se necessário que esteja embasado em indícios mínimos de que estão praticando atos de improbidade, o que ainda não aconteceu.

Imprescindível que se esgote os meios investigativos à disposição do Ministério Público para que volte a juízo com mais elementos probatórios”.

Barros Leite ainda cita que “sabe-se que ‘a ação cautelar é sempre dependente do processo principal e visa apenas garantir a eficácia da futura prestação jurisdicional. Sem que existam elementos para o deferimento da medida pretendida, a extinção prematura é medida de rigor, pela perda do objeto cautelar”.

ENTENDA O CASO

Como se recorda, em investigação de eventual enriquecimento ilícito, o Ministério Público do Estado de São Paulo fez requerimento de autorização judicial de quebra de sigilo fiscal e bancário de Eugênio José Zuliani; Beatriz Mendes Zuliani; Ana Cláudia Casseb Finato; Cobrani Cobranças Empresarial Ltda.; GZ Distribuidora Ltda. – ME; Leonardo Christófalo Vietti; LCG Aluguel de Equipamento e Comércio de Máquinas Ltda.; Maria Francisca Lopes; Cleber José Cizoto; São Matheus de Olímpia Escritório de Contabilidade Ltda.; Edson Ilário da Silva; Walter José Trindade, Datema Ambiental Saneamento Básico Ltda.; Laraya, Laraya & Laraya Ltda.; Marcos Garcia Laraya.

Suspeito de enriquecimento ilícito junto com prefeito

tem vínculo com a Prefeitura desde fevereiro de 2009

Embora no site oficial da Prefeitura o nome apareça em uma publicação do dia 11 de dezembro, uma das pessoas investigadas pelo Ministério Público de Olímpia, Marcos Garcia Laraya, mantém vinculo com o Poder Executivo do Município de Olímpia desde meados de fevereiro de 2009. Pelo menos isso é o que indica um levantamento feito nos últimos dias pela reportagem desta Folha.

Segundo uma informação publicada pela assessoria de imprensa, quando da nomeação de Alaor Tosto do Amaral no cargo de secretário municipal, junto com Walter José Trindade, que também é investigado, Marcos Garcia Laraya era o terceiro votuporan­guense que aportava em Olímpia para ocupar cargos de relevância na administração pública.

Segundo foi apurado também, ele teria vindo junto com Trindade e teria assumido um cargo de assessoria do superintendente do então DAEMO (Departamento de Água e Esgoto do Município de Olímpia).

Também foi apurado que Trindade, que consta ser pessoa ligada ao deputado federal Rodrigo Garcia (que seria principal mentor do governo de Eugênio José Zuliani), foi convidado para o cargo em fevereiro de 2009, justamente para substituir o engenheiro Gilberto Tonelli Cunha, que estava de saída para atuar em uma empresa do ramo de meio ambiente.

Há confirmação da ligação entre Laraya e Trindade na publicação do dia 11 de dezembro de 2009, quando informava a chegada de Tosto Amaral: “É o terceiro votuporanguense a fazer parte do time do prefeito de Olímpia. Os dois anteriores são Valter Trindade e Marcos Garcia Laraya, o primeiro como superintendente do DAEMO (Departamento de Água e Esgoto) e o segundo como seu assessor”, diz trecho da nota.
Além disso, o nome Laraya aparece mais fortemente no site da Prefeitura Municipal em informações a respeito da prestação de assessorias às várias Secretarias Municipais, a partir de 2013.

Por exemplo: “Na manhã de quarta-feira, 2 de abril, o Secretário de Assistência e Desenvolvimento Social Gustavo Pimenta esteve reunido com a equipe da Laraya Consultoria e colaboradores do RH da Prefeitura para o acompanhamento das Metas do Planejamento Estratégico traçado para os rumos administrativos da gestão atual de sua pasta”.

MATHEUS LARAYA

“Nesta nova etapa estamos fazendo o acompanhamento das metas das secretarias, hoje no caso da Assistência Social. Reuniões como esta servem para analisarmos o que está sendo cumprido, quais são os problemas que estão surgindo, em que momento podemos ajudar e ver os próximos caminhos para serem traçados pela Secretaria”, disse o diretor da Laraya Consultoria, Matheus Laraya. No processo aparece o nome de Matheus Ferreira Laraya.

Em publicação do dia 1.º de abril, a informação é que o mesmo trabalho foi realizado com a equipe da Secretaria de Educação “com colaboradores do RH e da Laraya e Laraya Consultoria, responsável pela implantação do Planejamento Estratégico nos departamentos da Prefeitura de Olímpia”, diz em um trecho.

Já a equipe da Secretaria de Saúde esteve reunida no dia 10 de abril com a Laraya Consultoria e membros do Recursos Humanos da Prefeitura de Olímpia para o acompanhamento das metas apresentadas recentemente.

Em publicação do dia 11 de junho a informação é que o ECR – Escritório de Captação de Recursos, dirigido por João Paulo Polisello esteve reunido com a Laraya Consultoria, com o objetivo de revisar a normativa que estabelece os desígnios do ECR.

“O objetivo é a revisão e rees­truturação da Lei que regulamenta o departamento, com alteração do organograma. Reunimos a equipe para em conjunto discutirmos como traçar as funções orga­nizacionais e funcionais”, dizia o consultor Matheus Laraya, segundo a nota publicada no site.

Advogados comentam decisão do juiz da Terceira Vara local

Nos últimos dias a reportagem desta Folha ouviu alguns advogados que atuam na área do direito público, que, embora com a solicitação de que tivessem seus nomes preservados, comentaram a decisão do juiz da 3.ª Vara de Olímpia, Sandro Nogueira Barros Leite, negando o pedido da promotora Valeria Andrea Ferreira de Lima, titular da 2.ª Promotoria de Olímpia, de quebra de sigilo bancário e fiscal do prefeito Eugênio José Zuliani e mais 11 pessoas.

“O que se conclui é que o MP queria quebra do sigilo bancário e isso é medida cautelar preparatória. O que o juiz entendeu é que não houve provas suficientes do que o MP pleiteou. Por isso o juiz diz que o MP deve colher mais provas para depois vir a juízo. Pelo que entendo o juiz está demonstrando que documentos o MP pode buscar para embasar nova medida”, avaliou um dos advogados consultados.

“O Juiz, pelo que se vê, tem entendimento que Ministério Público ou quem, eventualmente, promover a competente ação civil de improbidade, tem o ônus de especificar e provar o ato de improbidade causador do enriquecimento indevido do agente público”, comentou outro.

“Para ele há que ficar demonstrada a ilicitude da causa do enriquecimento ou não se poderá presumir sua origem antijurídica. Para o juiz os fatos deverão ser apurados por meio de inquérito civil e a Ação por Improbidade administrativa terá que se pautar no Princípio do devido processo legal”, reforçou.

De acordo com outro advogado, há também o entendimento de que o pedido baseado exclusivamente em denúncia anônima é inadmissível: “No Estado Democrático de Direito, baseado na Carta de 1988, o sigilo bancário somente pode ser suspenso pelo Poder Judiciário e pelas Comissões Parlamentares de Inquérito”, disse.

“No entanto, afirma outro advogado entrevistado, o caráter não absoluto do segredo bancário, que constitui regra em direito comparado, no sentido de que deve ele ceder diante do interesse público, é reconhecido pela maioria dos doutrinadores. O segredo há de ceder, entretanto, na forma e com observância de procedimento estabelecido em lei, hipótese a que se não ajusta simples denúncia anônima”.

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